Tag Archive for: estudos de Música para 1º Ciclo

Capuchinho Vermelho

CANTOS E CONTOS

por Benita Michahelles

Excerto da monografia apresentada ao Curso de Musicoterapia do Conservatório Brasileiro de Música sob a orientação de Marly Chagas.

A psicanalista Angela Maria Bouth fez um estudo sobre as cantigas de roda brasileiras, fazendo uma articulação com o pensamento de Bruno Bettelheim. Segundo a sua hipótese,

“(…) a brincadeira de roda possui conteúdo similar ao dos contos de fadas alimentando a imaginação e a fantasia, oferecendo à pessoa em desenvolvimento a oportunidade de encontrar a sua própria solução para conflitos internos (…)”

Bettelheim cita nos seus estudos o exemplo da medicina tradicional hindu, na qual se utilizava, justamente, um contos de fadas personificando o problema particular da pessoa psiquicamente desorientada, como estímulo para a meditação, conduzindo-a a uma melhor visualização do impasse vivido, e dos caminhos possíveis para a sua resolução.

Por outro lado, Ana Ferro faz uma analogia entre o jogo num aspecto geral e o conto-de-fadas. “… O jogo parece-me ter muitas características de um conto-de-fadas personalizado…” Para ela, ambos se constituem nas relações primárias do desenvolvimento humano, quando na relação com a mãe, a brincadeira com sons, balbucios e verbalizações, subentende profundos intercâmbios comunicativos assim como valiosas trocas emocionais e afetivas.

A mesma autora também discute as possibilidades que o conto oferece à criança de se identificar com os seus personagens e vivê-los do seu interior. Ela aponta que ele oferece a criança a oportunidade de “dar um nome, uma trama e um sentido às angústias que obscuramente o invadem.”

Neste contexto, Ana Ferro também menciona Bettelheim e o seu trabalho de interpretação de contos-de-fada. Porém, ela faz uma interessante crítica à visão deste psicanalista ao apontar para a questão da “insaturabilidade dos contos”.

“… não creio que os contos estejam ali representando de modo completo, pelo menos não tão completo como ele sugere, os medos e as ânsias das crianças…”

Para esta autora, os contos funcionariam muito mais como que recipientes de formas e tamanhos diferentes podendo vir a ser preenchidos por cada um de acordo com as suas particulares necessidades emocionais. “Uma espécie de proposta de simbolização que poderá depois ser utilizada de modos diferentes por cada criança.”

Acredito que a relação das crianças com as cantigas e brincadeiras-de-roda ocorra de maneira similar a exposta por Ferro quanto aos contos. Ao escolher uma cantiga no grupo de brincadeiras, a criança estaria fazendo-o de maneira condizente com a sua situação interna naquele momento, buscando uma comunicação com os seus conteúdos mais profundos, assim como uma maneira de elaborá-los.

Angela Bouth complementa esta ideia. Ela cita o exemplo de uma criança que necessite trabalhar internamente aspectos agressivos, podendo escolher “A carrocinha pegou”. Então ela irá fazer de tudo para convencer o grupo a aceitar a sua proposta, podendo inclusive ter ataques de raiva se fosse o caso de ela não ter o seu desejo atendido.

A brincadeira possibilita um distanciamento adequado por parte da criança em relação aos seus próprios conteúdos inconscientes, dando-lhe a oportunidade de ter algum domínio sobre eles. Isso suscita um processo de fortificação do ego.

Um depoimento de uma senhora de 48 anos citado por Bouth, contribui para ilustrar a dimensão do significado das cantigas e brincadeiras-de-roda na infância. Pelo menos na infância de uma boa parcela dos adultos de hoje.

“…Última filha de um casal conservador e religioso, sexualidade infantil era depoimento dos demónios. Logo, a possibilidade de brincar com os meninos era zero. Sobravam então as brincadeiras-de-roda. Aquele era o único momento em que eu me revelava anonimamente (…) as letras das músicas – cujo sentido secreto só eu sabia (assim eu pensava) (…) a afirmação da independência diante dos adultos, quando eu falava alto, sem interferência de ninguém (…) só assim foi possível sobreviver a tanta opressão.”

O aspecto da repetição é típico tanto em relação aos contos como em relação ao brincar e ao cantar de maneira geral. Ela é essencial para a concretização do processo de elaboração dos próprios conteúdos que estão em jogo.

“(…) a criança quer não só ouvir as mesmas histórias como também repetir as mesmas experiências e isto dá-lhe um grande prazer. Essa satisfação está relacionada com a busca da primeira experiência, que pode ser o primeiro terror ou a primeira alegria. Assim, a repetição não só é um caminho para tornar-se senhor das ‘terríveis experiências’ como também de saborear sempre com renovada intensidade os triunfos e vitórias.” (Benjamin)

A fantasia faz-se presente em todo o contexto das brincadeiras-de-roda, até pelos personagens que geralmente são representados pelos participantes – numa utilização de um recurso transferencial – assim como pelas imagens propiciadas pelas letras e climas musicais. Mário de Andrade (1980) afirma que a voz cantada atinge necessariamente a nossa psique pelo dinamismo que nos desperta no corpo. Numa perspetiva musicoterapêutica, penso que, com a associação dos conteúdos poéticos à experiência de auto-expressão musical e corporal, ambos os processos ocorrem simultaneamente, influenciando-se e intensificando-se um ao outro.

Capuchinho Vermelho

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Crianças tocando

A INTELIGÊNCIA MUSICAL

Excerto de O Ensino da Música no Ensino Básico, por Mariana Sofia da Silva Adrego, Mestrado em Ensino de Educação Musical no Ensino Básico, ESEC, Coimbra, 2016

«De todos os talentos com que os indivíduos podem ser dotados, nenhum surge mais cedo do que o talento musical» (Gardner).

Gardner, no seu livro “Estruturas da Mente” para apresentar a inteligência musical, começa por dar um exemplo hipotético de 3 crianças que, em idade pré-escolar, apresentam performances musicais extraordinárias. Apesar desta suposição, o psicólogo considera estes desempenhos como um fenómeno genuíno devido a «um regime de instrução soberbamente delineado» (Gardner). No entanto, o talento que estas podem deter não será suficiente para determinar o seu sucesso.

Gardner indica que a inteligência musical «permite às pessoas criar, comunicar e compreender significados compostos por sons.» Ao contrário da inteligência linguística, que se desenvolve nas diferentes culturas sem instrução formal, a inteligência musical requer uma exposição mais intensiva. Para os povos do ocidente atingirem elevado nível de habilidade são necessários anos de prática.

Os autores indicam ainda que esta capacidade é autónoma relativamente a outras capacidades podendo-se revelar num alto nível em pessoas cujas outras capacidades são médias ou mesmo deficientes.

Esta inteligência destaca-se em compositores, maestros, instrumentistas, peritos em acústica e engenheiros áudio.

Como principais elementos constituintes da música, Gardner considera o tom, o ritmo e, por último, o timbre. Para a identificação destes elementos, assim como para a participação musical é crucial o sentido da audição. No entanto, relativamente à organização rítmica, esta «pode existir independentemente de qualquer realização auditiva» (id.). Assim, pode-se dizer que determinados aspetos da experiência musical são acessíveis a indivíduos que não podem usufruir do sentido auditivo. O psicólogo indica ainda que especialistas, além dos constituintes da música já mencionados, colocaram também perto do centro os aspetos afetivos podendo residir aqui «o enigma central em relação à música» (Gardner).

Apesar da ciência positivista descrever a música em termos físicos e objetivos, certo é que ela consegue produzir efeitos emocionais em quem a ouve. O psicólogo cita Rogers Session, Arnold Shoenberg ou Stravinsky como compositores que reconhecem esse efeito que a música pode provocar nas pessoas.

«A música não pode expressar medo, que é certamente uma emoção autêntica. Mas seu movimento, seus sons, acentos e padrões rítmicos podem ser inquietantes, agudamente agitados, violentos e até mesmo repletos de suspense… Ela não pode expressar desespero, mas pode movimentar-se lentamente numa direção predominantemente descendente; sua textura pode tornar-se pesada e, conforme é nosso hábito dizer, “escura” – ou ela pode desaparecer totalmente» (Sessions cit in Gardner).

Gardner alude ainda a estudos do psicólogo Paul Vitz que demonstraram que sons agudos evocam um afeto mais positivo tanto em ouvintes como em intérpretes.

Relativamente ao desenvolvimento da competência musical, o autor recorre a Mechthild e Hanus Papousek, indicando que estes notaram que bebés entre os dois e os quatro meses prestam mais atenção a aspetos musicais como a altura, volume e contorno melódico das canções, do que propriamente às propriedades centrais da fala. Por volta dos dois anos, os bebés começam a compor músicas espontâneas e, posteriormente, reproduzem pequenos trechos de canções ouvidas no seu ambiente familiar.

No entanto, pelo 3º ou 4º ano, as melodias do ambiente dominante prevalecem em detrimento das músicas espontâneas e brincadeiras de sons exploratórios. Por volta da idade escolar, a criança (na cultura ocidental) já possui um esquema de como uma canção deveria ser, reproduzindo-a com alguma precisão. A partir dessa idade o desenvolvimento musical não é relevante (a não ser em casos de crianças com talento musical incomum ou com oportunidades excecionais).

Caberia à escola desempenhar um papel importante no desenvolvimento das habilidades musicais, no entanto os saberes da língua e da matemática sobrepõem-se sendo, na nossa cultura aceitável o «analfabetismo musical» (Gardner).

(…)

Crianças tocando

Crianças tocando

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Menina tocando flauta de bisel

CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO BÁSICA

Excerto de A Música como Veículo Promotor de Ensino e Aprendizagens, por Paula Cristina Viveiros da Silva. Mestrado em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico. Universidade dos Açores, Ponta Delgada 2012.

“A palavra currículo é de origem latina e significa o caminho da vida, o sentido, o percurso de uma pessoa ou grupo de pessoas.”

Poder-se-á dizer que é um projeto, algo que não está pronto e acabado, mas sim trata-se de algo que está a ser construído permanentemente, no dia a dia das nossas escolas, mais precisamente com a participação ativa de toda a comunidade escolar, nomeadamente os educadores, professores e restantes membros da comunidade escolar em que a escola se integra.

O currículo deverá ser encarado como um instrumento que favorece os princípios e orientações dos educadores/professores numa ação prática efetiva em prol do desenvolvimento dos seus alunos, ou seja, este instrumento, deverá ser um guia, uma ferramenta útil que permite orientar a prática pedagógica.

Para tal, importa salientar que o currículo deverá ser abrangente, deverá ser flexível, adequar-se aos diferentes conteúdos e métodos de aplicar o conhecimento aos alunos, para que assim permita um melhor desenvolvimento dos mesmos relativamente ao seu próprio processo de avaliação.

Neste sentido, as Orientações Curriculares/Programas, incluem as áreas de Expressão Artística, nomeadamente a Área de Expressão Musical, dada a importância que as mesmas têm no desenvolvimento global da criança. As áreas de Expressão Artística, tal como afirma Reboredo devem fazer parte de “qualquer área de transmissão do conhecimento, para além de ser [em] um instrumento harmonioso para a aquisição das aprendizagens, [são] também uma ferramenta que proporciona o incentivo dos alunos na realização de determinadas actividades que à partida para estes poderão lhes ser difíceis de concretizar”.

Ainda no respeitante ao conceito de currículo, Roldão considera que repensar a escola implica que os profissionais de educação deverão examinar, analisar, avaliar e constantemente ajustar “o modo como organizam o seu ensino ao efectivo sucesso da aprendizagem de cada um dos seus diferentes alunos”.

Para que tal percurso se faça concretizar nas nossas escolas, há que ter em conta as condições para que o currículo se cumpra, nomeadamente, os recursos de que o professor dispõe para lecionar as suas aulas, as especificidades dos alunos (se estes têm todas as condições para que aprendam e desfrutem das suas aprendizagens), o contexto do ambiente escolar, as caraterísticas dos materiais didáticos disponíveis e ainda a participação da comunidade na realização das atividades escolares.

No respeitante à gestão de recursos das escolas, Afonso refere que

“A autonomia da organização da escola é constitutiva da própria realidade organizacional, resulta da capacidade de gerir as relações com o exterior, e de produzir internamente uma identidade própria.”

Assim sendo, o currículo não deverá ser visto como algo que substitua o professor, mas sim como um meio ao seu serviço e da comunidade escolar. Cabe ao educador/professor nortear o processo de ensino-aprendizagem, modificar se possível, o próprio currículo de acordo com as aptidões, interesses e caraterísticas culturais da turma de alunos que leciona, bem como as características dos recursos existentes na escola.

Para Dinis

“A gestão curricular integrada na escola visa a melhoria da qualidade educativa pela abordagem ecológica e contextual dos problemas concretos de cada comunidade educativa.”

No entanto, o papel do currículo leva-nos a refletir, sobre o seu papel no desenvolvimento integral dos alunos, isto é, se este percurso é coerente, significativo e devidamente amplo contemplando as necessidades de cada aluno de modo a que este se sinta capaz de prosseguir no seu percurso escolar, fazendo face às suas exigências.

Por exemplo, como hoje em dia dá-se mais importância a determinadas áreas de saber, nomeadamente à Matemática, ao Português e ao Estudo do Meio, áreas mais privilegiadas pelos professores e até mesmo os encarregados de educação, no que se refere às áreas das «Artes», na Educação Básica as Expressões Artísticas, estas vão sendo tratadas como domínios de conhecimento secundários na educação dos seus educandos.

Ora, se um aluno que possuí uma determinada apetência para as artes, nomeadamente para a pintura, a música, o teatro, o cinema, entre outros, deverá este aluno enveredar para outros caminhos que não sejam aqueles que mais ambiciona, apenas porque os pais ou os professores consideram esta sua área preferida, menos importante?

Esta questão leva-nos a refletir sobre a importância destas áreas, atualmente tão pouco implementadas pelos educadores/professores, serem reforçadas na educação básica. Daí a possibilidade de se pensar na interdisciplinaridade nas nossas escolas, como um modo de viabilizar as interações e inter-relações entre as diferentes disciplinas existentes, permitindo assim que cada aluno construa o seu conhecimento em respeito ao que é comum e ao que é individual.

A interdisciplinaridade deverá ser encarada como um processo de troca de reciprocidade entre as diferentes disciplinas ou áreas de conhecimento.

“Por interdisciplinaridade, deverá então entender-se qualquer forma de combinação entre duas ou mais disciplinas com vista à compreensão de um objecto a partir da confluência de pontos de vista diferentes e tendo como objectivo final a elaboração de uma síntese relativamente ao objecto comum. A interdisciplinaridade implica, portanto, alguma reorganização do processo de ensino/aprendizagem e supõe um trabalho continuado de cooperação dos professores envolvidos.” (Pombo).

Os mesmos autores ainda reforçam a ideia ao afirmar que

“(…) a interdisciplinaridade implica um esforço de exploração de contributos e resultados das diversas disciplinas, de confronto e cruzamento das suas metodologias, de transposição conceptual, de procura de linguagens comuns, numa palavra, de convergência e complementaridade dos discursos. Ela está fundada na crença de que é possível alcançar uma síntese relativamente ao objecto comum e que essa síntese exprime melhor a verdade desse objecto do que cada uma das perspectivas parciais que, sobre ele, cada disciplina oferece.” (Ibid.)

Além disso, esta deve ser entendida como um modo de organizar os conteúdos das diferentes áreas de conteúdo e domínios com o intuito de os integrar num processo flexível de aprendizagem que vá de encontro aos objetivos educativos e que tenha sentido para a criança.

Pois, e no caso mais específico da música, esta arte deve ser encarada como uma construção social e humana que interage de modos diversos não só com a construção das identidades, individuais e coletivas, como também com diferentes áreas do saber e do conhecimento artístico, humanístico, científico e tecnológico.

O desenvolvimento do trabalho artístico-educativo pode ser, por um lado, um meio aglutinador de diferentes saberes e conhecimentos e, por outro, servir para despoletar a curiosidade e o conhecimento acerca dos modos como nos outros saberes se utilizam, manipulam e inventam ideias e conceitos.

“Acredita-se que a educação estética e artística, processando-se num continuum ao longo da vida, tenha implicações no apuramento da sensibilidade e do sentido crítico, podendo constituir uma condição necessária para um nível cultural mais elevado das populações, prevenindo novas formas de iliteracia, facilitando a integração dos indivíduos na nossa Sociedade.” (Funch)

Ao escutar e cantar a criança está a desenvolver capacidades ao nível da linguagem. Ao dançar e tocar é explorada e desenvolvida a sua motricidade. A construção de instrumentos e de adereços de suporte à música ou à dança relaciona-a com a expressão plástica, bem como a outras áreas de expressão artística. Assim, a música tem a capacidade de aglutinar em seu torno as variadas áreas do conhecimento e do saber.

De acordo com os diversos autores, Lino & Niza

“A articulação curricular deve promover a cooperação entre docentes da escola, procurando adequar o currículo aos interesses e necessidades específicas de cada aluno (…)”.

cabe ao educador/professor, articular a teoria com a prática, numa maneira interdisciplinar sem perder de vista os objetivos fundamentais elencados para a sua disciplina, pois ao projetarmos esse olhar interdisciplinar, chegaremos à transdisciplinaridade.

Nesta perspetiva,

“o perfil do professor actual é o de um profissional apetrechado com os instrumentos teóricos, técnicos e práticos que lhe permitem desempenhar uma prática reflexiva, capaz de dar resposta à diversidade de exigências com que é confrontada a escola de hoje e do futuro”. (Alonso)

Esta perspetiva permite-nos a compreensão do conhecimento, a busca da inclusão dos nossos alunos e também dos conceitos de aprendizagem, bem como a procura de parcerias em que se torna possível compartilhar, cooperar e agregar o conhecimento.

Acima de tudo e segundo a opinião de Dinis

“O currículo é uma construção histórica e social complexa e expressa o conflito de interesses, forças, poderes e valores que se constituem referência de uma cultura.”

Os alunos estão relacionados com o currículo, tal como a organização dos tempos e espaços escolares, bem como o conhecimento e a cultura, a diversidade e inclusão social, fazem parte de todo o processo de integração e avaliação do currículo escolar.

Ainda segundo a mesma autora,

“O currículo é então um projecto amplo e global, em permanentemente desenvolvimento e aperfeiçoamento que, ao ser construído ‘na/ pela escola’ e ‘para a escola’, contribui, também, decisivamente para construção ‘da escola’ de qualidade, enquanto comunidade reflexiva e autónoma. A sua construção implica a participação e a colaboração de todos os agentes educativos (professores, alunos, pais, pessoal não docente, autarquias, museus e outros parceiros locais) e a articulação coerente de recursos, necessidades, interesses, experiências e aprendizagens visadas.” (Ibid.)

Deste modo, o educador/professor de hoje deverá pensar na pessoa do aluno, como sendo um ser humano, e que pela sua própria natureza é um ser de múltiplas dimensões, que aprende em tempos e em ritmos diferentes. Por isso, o seu conhecimento deverá ser construído e reconstruido processualmente e abordado numa perspetiva integrada e organizada.

(…)

Menina tocando flauta de bisel

Menina tocando flauta de bisel

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Crianças tocando percussão e flauta

MÚSICA PARA TODOS

Excerto de O lugar da Música no Ensino Básico: Música para todos, por Mário Relvas 2009

O debate sobre o que se deve aprender vem desde os gregos: Platão estabeleceu uma hierarquia de saberes com a Filosofia no topo e no século XX John Dewey defende a importância de realizar na sala de aula atividades com valor intrínseco em 7‐8 áreas de saber, estas últimas retomadas por Gardner na Teoria das Inteligências Múltiplas.

Há quem use a Música apenas quando mais nada resulta — veja‐se o que se passa nos TEIP — ou então para “abrilhantar” as festas em que o “prato forte” é a História, o Português ou a Matemática.

Para além destas razões, importantes, mas colaterais, devemos fazer Música no 1º ciclo porque:

  • ela é um sistema simbólico dos nossos sentimentos, ligada à nossa vida emocional;
  • as estruturas e padrões musicais desencadeiam em cada pessoa associações e significados;
  • ao trabalharmos Músicas de várias partes do mundo ou mesmo do interior do nosso País vamos ajudar os alunos a desenvolver o respeito e a compreender as outras culturas;
  • há várias inteligências que precisam ser desenvolvidas e a musical é uma delas.

No pré‐escolar e no 1º ciclo Educar a função do educador e do professor é não só instruir e formar, mas também, e principalmente, desenvolver. Assim, o entendimento atual em vários Sistemas Educativos Ocidentais é o de ensinar MÚSICA a todos, de desenvolver as capacidades musicais de todas as crianças e não apenas de algumas, numa perspetiva do desenvolvimento global das capacidades inatas do ser humano. Por isso é que em Portugal a Música é uma área curricular disciplinar, tal como o Português e a Matemática.

Educador de infância e professor de 1º ciclo ensinam Música

A obrigatoriedade de Música no currículo parece que põe em confronto a extensa preparação de um músico instrumentista profissional e a parca preparação em Música dos professores generalistas. A resposta é simples: há muitas maneiras de fazer Música, muitas das quais ao alcance do generalista.

Não há dúvida que é necessário um especialista para ensinar a tocar um instrumento, dirigir um agrupamento instrumental ou coral, mas como educar musicalmente é muito mais do que isto, o professor generalista tem um papel
indispensável, sendo aquele que melhor pode integrar a Música com as outras áreas do saber.

Como ensinar Música

A Música é parte integrante do desenvolvimento intelectual, cultural, emocional e espiritual das crianças e não deve ser lecionada à parte, nem ser um reduto do especialista, antes deve ser integrada com as outras áreas. Os professores generalistas devem abordar o desenvolvimento musical como abordam o desenvolvimento da linguagem e da leitura, com encorajamento, com atividades estruturadas. Ensinar Música passa por experiências diretas de criar, tocar e ouvir. Tudo o que justifica a existência de Música no Ensino
Básico passa por fazer, por estar ativamente envolvido a fazer Música.

Objetivos a alcançar

O que é que os professores pretendem alcançar quando ensinam música?

  • desenvolver o potencial criativo,
  • compreender as funções da música na sua comunidade e no mundo,
  • compreender a música como forma de comunicação emocional.

Momentos musicais

Durante um dia de escola existem muitos momentos, espaços e situações para realizar atividades musicais:

  • toda a turma escuta uma pela musical gravada;
  • as sessões de movimento são acompanhadas de música gravada;
  • cantar para começar e acabar o dia de aulas;
  • cantar para memorizar outros assuntos;
  • cantar em línguas estrangeiras;
  • toda a turma.

O lugar da Música no Ensino Básico: Música para todos, por Mário Relvas, ESEL. Comunicação apresentada no Congresso do 1º ciclo “De Pequenino se Trilha o Caminho”, promovido pela editora Gailivro e realizado na Fundação Dr. António Cupertino de Miranda, no Porto, em 12 de dezembro de
2009.

Crianças tocando percussão e flauta

Crianças tocando percussão e flauta

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Criança com professora ao piano

[ “As investigações sobre o efeito da música no cérebro infantil coincidem em que esta provoca uma ativação das zonas envolvidas no processamento espacio-temporal.” ]

10 BENEFÍCIOS DA MÚSICA

À música, sobretudo a música clássica, são atribuídos vários tipos de benefícios. Entre outras coisas, diz-se que servem para reduzir a tensão, melhorar o ânimo ou que, inclusive, afeta positivamente plantas e animais. Aponta-se uma imensidão de benefícios para as crianças, assumindo grande importância no seu desenhvolvimento intelectual, auditivo, sensorial, linguístico, motor. As investigações sobre o efeito da música no cérebro infantil coincidem em que esta provoca uma ativação das zonas envolvidas no processamento espacio-temporal.

Nos seus primeiros anos, as crianças são recetores absolutos de todo o tipo de estímulos e, ao sentir a música de uma forma tão intensa, esta pode exercer uma influência muito poderosa e positiva, sempre que saibamos utilizá-la de forma correta, não a encarando como uma obrigação e sabendo escolher a música adequada para cada momento.

Sublinhamos 10 benefícios da música nas crianças:

  1. Melhora a capacidade de memória, de atenção e concentração das crianças.
  2. Estimula a sua inteligência ao melhorar a habilidade para resolver problemas matemáticos e raciocínios complexos.
  3. É um modo de exprimir-se e, inclusive, com a música a expressão corporal da crianças é mais estimulada.
  4. Introduz as crianças nos sons e significados das palavras, fortalece a aprendizagem e contribui para melhorar a linguagem. As letras das canções, por exemplo, além de favorecerem a discriminação auditiva, enriquecem o seu vocabulário. Comprovam-no as canções para crianças.
  5. Torna-as mais sociáveis, na medida em que a música cria a oportunidade de as crianças interagirem entre si e com os adultos.
  6. Desenvolve a criatividade e estimula a imaginação infantil, posto que a música estimula o hemisfério direito do cérebro, melhorando a capacidade para realizar qualquer outra atividade artística, como a pintura.
  7. Ao combinar-se com a dança, estimula os sentidos, o equilíbrio, e o desenvolvimento muscular das crianças, ao adaptar o seu movimento corporal aos ritmos, contribuindo também desta forma para potenciar o controle rítmico do seu corpo e melhorar a sua coordenação.
  8. Fomenta a evocação de recordações e imagens com a qual o intelecto se desenvolve.
  9. Estimula o desenvolvimento integral da criança, ao atuar sobre todas as áreas do desenvovimento.
  10. E, finalmente, ajuda a criar rotinas, estabelecendo assim as bases de uma futura disciplina, criando associações entre a música e outras atividades.

Por isso, não se pode ignorar que a música desempenha um papel muito importante no processo de ensino e aprendizagem dos alunos. Os professores, as instituições educativas, os pais e pessoal de saúde devem conhecer os alcances e benefícios da música nas crianças como parte importante da educação.

Criança com professora ao piano

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Menino tocando piano, foto Best Digital Piano Guides

Para as crianças, fazer música favorece as aprendizagens

O jovem músico brilha em todas as esferas cognitivas que dependem da atenção, como os testes de inteligência, a memória e as aquisições escolares.

Como a aprendizagem da música age sobre o nosso cérebro? Que efeitos tem sobre a curiosidade, a atenção e a memorização? É preciso tornar a aprendizagem da música obrigatória na escola? São algumas das questões colocadas por Isabelle Peretz.

Em Apprendre la musique. Nouvelles des neurosciences, livro editado pelas Editions Odile Jacob, esta investigadora aconselha a fazer música desde a idade de 6 meses. Ela cita um raro estudo em meio natural conduzido por professores da Universidade McMaster em Ontário (Canadá) sobre bebés.

“Os bebés e os seus pais aprendem um repertório de canções marcando o compasso, mexendo e cantando. Seis meses depois, as habilidades musicais dos bebés são testadas.” De modo interessante, a comunicação pais-filhos é mais intensa e o desenvolvimento socio-emotivo (exploração, sorrisos) melhora significativamente nos bebés “músicos”. “Vejo aí as primícias da inteligência”, analisa Isabelle Peretz.

Por volta dos 6 anos, reencontramos efeitos semelhantes. “As crianças de 6 anos que frequentam cursos de piano ou de canto durante um ano obtêm alguns pontos a mais na escala de medida da inteligência. Os cursos de teatro ou a falta às aulas, durante o mesmo período, não proporcionam tal vantagem.” Facto interessante, o ensino dos rudimentos da música a crianças de 8 anos durante seis meses, à média de uma aula por semana, ajuda à aquisição da leitura.

Um bom complemento à educação geral

A vantagem intelectual do jovem músico, que se exprime por resultados académicos superiores, parece manter-se durante toda a sua escolaridade. Assim, um inquérito recente realizado junto de 18 000 alunos confirmou que ao fim do secundário (entre os 16 e 17 anos), os alunos canadianos que participavam numa orquestra de sopros, um coro ou um agrupamento de cordas tinha uma taxa de sucesso mais elevada em todas as matérias avaliadas (Matemática, Biologia, Inglês).

Os que tinham seguido cursos de artes plásticas não mostravam tal vantagem. De notar, contudo, que a vantagem intelectual não se observa em músicos profissionais quando se comparam com profissionais não músicos. “Os estudantes de música não têm um QI superior aos estudantes universitários de outras disciplinas, nota Isabelle Peretz. Dito de outro modo, aprender a fazer música é uma vantagem quando a atividade faz parte da educação geral. Fazer disso uma profissão não assegura uma manutenção intelectual de alto nível.”

A ciência é encorajadora, mesmo em idade avançada pode-se aprender música. Isabelle Peretz

Traduzido por António José Ferreira da revista Le Temps (Suíça) (excerto)

Menino tocando piano, foto Best Digital Piano Guides

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Canção de Natal com coreografia

A Expressão Musical no Currículo do 1º CEB

Maria Salomé Dias

Ao longo do século XX, o ensino primário em Portugal sofreu mudanças, reflectindo transformações políticas, ideológicas e sociais. Apesar das várias reformas, o ensino da música constou sempre do currículo do 1ºCEB, embora sofrendo diversas designações, nomeadamente, Música e Canto Coral no ano 1911, Música no ano 1921, Canto Coral em 1928 e 1937 e Educação Musical em 1960.

Com a revolução de 1974, foram implementados novos currículos e novos programas, onde a área de Movimento, Música e Drama no 1ºCEB, reflectia ideias inspiradas no movimento internacional da “Educação pela Arte”, que contemplava cursos de formação de professores.

Desde 1989, a área das expressões integra o plano curricular do CEB, onde estão definidas as principais linhas orientadoras do Programa, estando estas assentes em estratégias de ensino, desvalorizando a definição de um quadro conceptual.

Reconhecendo as dificuldades de leccionação demonstradas pelos professores generalistas, a Lei de Bases do sistema educativo, em vigor desde 1986, define as Expressões como Áreas Curriculares, prevendo a possibilidade da existência do professor especialista que coadjuva o professor titular no desenvolvimento destas mesmas áreas, quando refere que, no 1º ciclo, o ensino é globalizante, da responsabilidade de um professor único, que pode ser coadjuvado em áreas especializadas, (Lei nº46/86, art.8º, nº1 alínea a). As alterações de 1997 e de 2005 não prevêem qualquer alteração no currículo do 1ºCEB, continuando em vigor o que foi definido em 1986, em que as expressões são parte integrante do Currículo, e como tal, têm de ser desenvolvidas conforme o previsto na Lei de Bases (1986).

Em 2006, o Ministério da Educação, instituiu uma norma para as escolas públicas do 1ºCEB, através do Despacho 12 591/2006 de 16 de Junho, onde o conceito de “Escola a tempo inteiro” prevê a permanência dos alunos por mais tempo na escola de forma a promover o sucesso escolar e apoiar as famílias, surgindo então as Actividades de Enriquecimento Curricular (AEC) que asseguram o prolongamento do horário em todas as escolas do 1ºCEB.

Este programa inclui obrigatoriamente o ensino de inglês para os alunos do 3º e 4º ano de escolaridade, e o apoio ao estudo com uma duração semanal não inferior a 90 minutos. Para além de frequentarem estas actividades de carácter obrigatório, destes planos podem constar outras actividades de enriquecimento, como o ensino da música, prática física e desportiva, bem como o ensino de outras línguas estrangeiras ou expressões artísticas. No entanto, quando se fala das AEC é necessário ter em conta a função da monodocência coadjuvada, uma vez que o professor titular de turma passa a partilhar o trabalho pedagógico com outros profissionais, tendo este a responsabilidade da coordenação pedagógica.

Nos últimos quatro anos, as alterações preconizadas pelo Ministério da Educação relativamente às AEC, trouxeram alguma esperança relativamente a um maior desenvolvimento da educação artística no 1º CEB. As actividades extra curriculares e o conceito de escola a tempo inteiro, salvaguardado no Despacho 12 591/2006 de 16 de Junho, seriam em teoria uma mais-valia para o desenvolvimento da educação artística no ensino básico. No entanto, no Despacho n.º 14460/2008 de 26 de Maio de 2008, que regulamenta as AEC, é referido que estas não são de carácter obrigatório, sendo frequentadas apenas por alunos inscritos nas mesmas, mediante autorização dos encarregados de educação. As áreas que têm de estar contempladas nas AEC são o inglês e o apoio ao estudo, ficando o ensino de outras línguas estrangeiras, as actividades físicas e desportivas, o ensino da música e o de outras expressões artísticas, assim como de outras possíveis actividades indicadas nos domínios identificados no despacho, de carácter opcional, a gerir pela autarquia em cooperação com a escola.

Para a Comissão de Acompanhamento do Programa 2007/2008, existem alguns constrangimentos, nomeadamente no (…) Ensino da Música continua a deparar-se com um conjunto de constrangimentos de professores habilitados, mas também à articulação horizontal e vertical nas escolas e agrupamentos, reforçando a ideia dos professores titulares que podem dispensar as actividades nas áreas das Expressões. Paralelamente, e segundo a mesma autora, a insistência na recuperação dos alunos nas áreas consideradas prioritárias – Português e Matemática – e o surgimento das Expressões como AEC induz nos professores titulares de turma o esquecimento das Expressões como componentes do currículo, uma vez que sentem, e afirmam, que as AEC colmatam essas áreas do currículo.

No entanto, é esquecido que as AEC não são de frequência obrigatória e como tal são áreas de frequência facultativa, podendo os alunos chegar ao 2º CEB sem nunca terem desenvolvido actividades na área das Expressões. Também a contratação de professores com formação específica para leccionar as AEC, reforça nos professores titulares a ideia de que não possuem formação especializada no ensino das Expressões, assim como a urgência em trabalhar as áreas consideradas prioritárias, faz com que deleguem esta responsabilidade nos professores das AEC. Por outro lado, também se torna difícil motivar os professores titulares das turmas para a formação e para a necessidade de articulação dos programas das áreas das Expressões, reportando esta responsabilidade para os professores que a leccionam.

Um outro constrangimento e de acordo com a mesma autora, prende-se com a formação dos professores que leccionam as AEC, sendo professores com formação muito diversa no que diz respeito à Música, necessitando por isso de apoio e enquadramento, que os responsáveis pelo recrutamento destes professores não podem dar, nomeadamente, as Câmaras Municipais. Segundo o Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação, e ao analisar o Relatório de Actividades de Enriquecimento Curricular 2009/2010, referente ao ensino da Música no âmbito das AEC, verifica-se que a percentagem de estabelecimentos de ensino, a dinamizar esta área de expressão é de 81,4%, devido à falta de professores habilitados para colocar em prática estas actividades. Por outro lado, a taxa de adesão dos alunos que frequentam esta área é de 67,4%, devendo-se ao facto de estas actividades não serem de carácter obrigatório.

Na perspectiva de Gabriela Canavilhas, a educação artística constitui uma dimensão importante da educação, a que todos os cidadãos devem ter acesso, independentemente das suas aptidões ou talentos específicos, devendo fazer parte da formação geral de todos os alunos, constatando-se com o disposto na Lei nº 46/86, art.7º alínea c, onde menciona que o ensino básico deve promover a educação artística, de modo a sensibilizar para as diversas formas de expressão estética, detectando e estimulando aptidões nesses domínios.

Também o Currículo Nacional do Ensino Básico (ME, 2001) salienta que o lugar das Artes, em geral, e da Música em particular, continua a ter contornos pouco explícitos e a ser encarado como algo que aparentemente está assumido, ficando, no entanto à margem, quer em termos conceptuais como programáticos. Neste sentido, Jos Wuytack e Graça Palheiros, afirmam, que ao longo do século XX,

(…) a educação artística, em geral, e a educação musical em particular, têm percorrido um caminho, por vezes difícil, entre a imposição de currículos baseados no saber “ler, escrever e contar”, e a ideia elitista de que a música é um privilégio reservado a seres particularmente dotados.

Para estes autores, esta situação, repercute-se na falta frequente de uma prática musical no ensino genérico, mais significativa no 1ºCEB, onde é leccionada por professores que possuem, em geral, uma formação insuficiente nas áreas artísticas, necessitando de serem apoiados por professores especialistas para que assim o currículo possa ser cumprido. No entanto, é hoje aceite que a educação musical é uma disciplina importante no currículo escolar, com um programa próprio, e que, enquanto tal, faz parte integrante na educação global da criança.

Ao consultar-se o Currículo Nacional do Ensino Básico (ME, 2001), verifica-se que este documento apresenta um conjunto de competências musicais bastante ambicioso. No que refere à música, esta é um elemento importante na construção de outros olhares e sentidos, e as competências artístico-musicais desenvolvem-se através de vários processos de experiências e reprodução. No entanto, estas potencialidades nem sempre se verificam na prática. A educação do corpo, da audição, e da voz, desenvolve nas crianças, a capacidade de compreender o mundo, exprimir sentimentos e de criar. Segundo a Organização Curricular e Programas do 1ºCEB, o canto é a base da expressão e educação musical para este nível de ensino, sendo este o primeiro instrumento que as crianças devem explorar. Para além da voz, a exploração do corpo, é igualmente importante, pois permite através de actividades lúdicas, como a dança e os jogos, proporcionar o enriquecimento das vivências sonoro-musicais das crianças.

De acordo com J. Tafuri a educação musical no 1ºCEB, tem como objectivo dar à criança oportunidade e meios para uma explosão e utilização dos materiais sonoros que possam ajudar no seu desenvolvimento psico-físico e ao seu desenvolvimento da realidade. No entanto, um currículo musical que tem por base somente as experiências dos alunos resulta, segundo Swanwick, estéril e empobrece a inspiração e o desenvolvimento musical.

Uma Educação Artística, completa, não se pode resumir a um simples somatório de disciplinas, mas sim, a uma organização curricular, em que as letras, as ciências e as artes, tenham a mesma ponderação, possibilitando aos alunos uma formação equilibrada. Como menciona o Currículo Nacional do Ensino Básico (ME, 2001, p.169), a música deve atravessar todas as áreas disciplinares, tais como, as Ciências Humanas e Sociais, as Ciências Físicas e Naturais, a Matemática, a Expressão e Educação Físico-Motora, as Línguas e as Tecnologias.

Segundo C. Freitas,

(…) o currículo das escolas portuguesas é efectivamente mutilado porque lhes não é concedido desenvolver áreas fundamentais para a educação das crianças e jovens, entre as quais a música.

C. Freitas

Subjacente a esta afirmação, pode-se concluir que o currículo não é uma mera soma das diferentes disciplinas que tradicionalmente são oferecidas aos estudantes durante a sua vida escolar, mas, e segundo este autor, deve entender-se por currículo tudo o que a escola promove para que os alunos tenham aprendizagens significativas. Como advoga Roldão, o currículo assume um lugar central na educação escolar, sendo este um conjunto de aprendizagens consideradas socialmente desejáveis e necessárias num dado tempo e sociedade, que a instituição escola tem a responsabilidade de assegurar (…).

No caso específico da música, é necessário que na concepção de currículo esta tenha o seu lugar. Como afirma Eisner, se às crianças não forem dadas oportunidades para compor música, nunca terão possibilidade de se aperceberem o que significa a criação musical. Ainda segundo este autor a música tem de ser ensinada para que ganhe significado, sendo para isso necessário ter espaços próprios para que os alunos aprendam. Também Dalcroze, afirma que só uma educação que dê relevância à Educação Musical, nos contextos educativos, pode promover a evolução de um povo. Como argumenta a mesma autora, a cultura musical deveria ser pertença de todas as pessoas e não só pertença de uma certa elite.

Importa ainda referir o número de horas que é dedicado a cada uma das áreas, curriculares e não curriculares, para a leccionação dos programas e o desenvolvimento dos currículos, sendo estas distribuídas da seguinte forma: oito horas por semana para a Língua Portuguesa; sete horas para a Matemática; cinco horas para o Estudo do Meio, sendo que metade destas últimas devem ser dedicadas ao Ensino Experimental das Ciências; cinco horas para a área das expressões e restantes áreas curriculares, (Despacho nº19 575/2006 de 25 de Setembro).

É importante referir que este tempo lectivo deveria estar devidamente expresso no programa do 1ºCEB, para não existirem dúvidas nas horas que devem ser dedicadas às expressões. Também Canavilhas consolida que para além dos tempos lectivos ou do currículo, a valorização da Educação Artística no ensino básico implica o reforço do estatuto das disciplinas artísticas, de forma a garantir o seu contributo para a formação global do aluno e o seu justo reconhecimento enquanto disciplinas estruturantes do ser humano.

Esta realidade é salientada por A. Sousa, ao afirmar que,

Uma Educação Artística pressupõe, antes de tudo, que na organização curricular, letras, ciências, técnicas e artes tenham a mesma ponderação, haja equilíbrio e não preferências ou predominâncias, concorrendo em igualdade de circunstâncias para proporcionar aos alunos uma equilibrada formação cultural geral, homogénea e congruente – a harmonia estética na harmonia educacional.

A. Sousa

Operacionalização da Expressão Musical no 1º Ciclo do Ensino Básico, por Maria Salomé Araújo Alves Dias, Mestrado em Educação, Área de Especialização em Educação Artística, Trabalho efectuado sob a orientação do Professor Doutor Carlos Alberto dos Santos Almeida: Viana do Castelo, Instituto Politécnico de Viana do Castelo 2011

Leia AQUI a dissertação completa, se o desejar.

Canção de Natal com coreografia

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António Bernardo da Costa Cabral

Evolução Histórica da Música na Escola

Helena do Canto

Nas escolas de ensino oficial obrigatório, a área da Música é introduzida pela primeira vez nas reformas de Passos Manuel e Costa Cabral, com a progressiva institucionalização dos liceus entre 1836 e 1850, porém, funcionava apenas como Canto Coral; sendo submetida a várias modificações, relativamente ao currículo, programa e habilitações dos respectivos professores.

No entanto, a primeira grande reforma do ensino da Música nas escolas oficiais surge em 1968, cuja disciplina passou a ser obrigatória no quinto e sexto anos de escolaridade; e importa salientar que surge com um programa regulamentado, alterando-se o seu nome para Educação Musical. A disciplina de Canto Coral continuou no nono ano, funcionando como disciplina opcional.

Em 1990, a disciplina de Educação Musical é integrada em todos os anos curriculares até ao sexto ano como disciplina obrigatória, e, nos anos seguintes até ao décimo segundo como disciplina de opção. O Ensino Primário (actual Ensino Básico – 1º Ciclo) incluía no seu currículo desde 1936 a disciplina de Canto Coral que passou a chamar-se Educação Musical no programa de1960.

Em 1974, surge a disciplina de Música que apresenta já um misto de objectivos, conteúdos e metodologias (ME, 1974). Sugerindo uma ideia de Educação Musical mais evoluída, surge, em 1975, um programa elaborado para a disciplina de Música, Movimento e Drama que, entretanto, substitui a de Música e perdura até à publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE).

Violeta Hemsy, refere que a crise que a Educação Musical atravessa nestes últimos anos, não tem a ver com a falta de uma informação actualizada, mas sim com uma série de 45 obstáculos que persistem na prática pedagógica. A autora defende que, impera ao mundo da pedagogia musical, hoje, manejar-se com relativa fluidez na promoção da mudança e da transformação educativa, não só especificamente no que concerne à Música, como também na sua articulação com as outras disciplinas (1997).

O nosso sistema educativo abarca o ensino da Música no 1º Ciclo. Inicialmente, de uma forma bastante irregular, uma vez que era arrogada de forma deficitária no currículo. Todavia, no ano lectivo de 2006/2007, pelo Despacho nº 12591/2006 (2º série) de 16 de Junho de 2006, o Ministério da Educação promove diversas Actividades de Enriquecimento Curricular no 1º Ciclo do Ensino Básico, o qual implica o ensino da Música. Salientamos, ainda, que em 2008 o Ministério da Educação emite o Despacho nº 14469/2008 que, não só regulamenta de forma mais veemente as Actividades de Enriquecimento Curricular, como, também, lhes confere um maior grau de fiabilidade, uma vez que lhes atribui um carácter normativo, com uma carga horária semanal definida (90 minutos) e estabelece requisitos específicos para a leccionação desta área.

Educação Musical e Animação Socioeducativa no 1º Ciclo no âmbito das Actividades de Enriquecimento Curricular, Helena Maria Portugal do Canto, Dissertação de Mestrado em Ciências da Educação, Área de Especialização em Animação Sociocultural. Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Chaves 2010.

Música no Ensino Básico

Música no Ensino Básico

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